
Em um contexto em que Angola vive níveis alarmantes de fome e desnutrição infantil, nasce uma iniciativa transformadora: “Papas Yasmin”, criada por Azenalda Miguel. Inspirada pela maternidade e pelos ensinamentos familiares, Azenalda desenvolveu um método que converte produtos regionais em papas nutritivas para combater, de forma concreta, a mais cruel das carências: a fome infantil.
Segundo dados recentes do Inquérito de Indicadores Múltiplos e de Saúde (IIMS 2023-2024), 40% das crianças menores de cinco anos no país sofrem de desnutrição crónica, que se manifesta pela baixa estatura para a idade. A degradação nutricional é ainda maior nas zonas rurais, onde atinge 51% dessas crianças, enquanto nas áreas urbanas o número cai para 31%. Em províncias como Bié, Cuanza Sul, Uíje, Huambo, Huíla, Cuanza Norte e Malanje, as taxas variam de 45% a 56%.
Outros indicadores reforçam a gravidade da situação: em 2023, Angola registrou cerca de 45.000 casos de desnutrição aguda infantil no primeiro semestre. Também se verificou que “mais de 1,3 milhões de pessoas”, o equivalente a 4% da população, enfrentarão níveis elevados de insegurança alimentar aguda em 2023, com previsão de que esse número suba para 1,5 milhões ou cerca de 5% da população em 2024. Além disso, mais de 11 milhões de pessoas conviveram com insegurança alimentar grave, incapazes de garantir acesso diário a alimentos mínimos.
A importância do método de Azenalda
O diferencial do método Papas Yasmin está em aproveitar produtos locais — como milho, mandioca e banana — enriquecendo-os com vitaminas e minerais, para criar papas nutritivas de baixo custo e alto valor nutricional. Esse tipo de abordagem local é crucial em Angola, onde fatores como inflação, aumento dos preços dos alimentos, crises climáticas e dificuldades logísticas elevam os custos e agravam a insegurança alimentar.
Além disso, o projeto gera impacto duplo: combate imediato da fome infantil e estimula a economia local, fortalecendo produtores rurais, reduzindo a dependência de importações e promovendo a autonomia alimentar em comunidades vulneráveis.
Perspectivas e desafios
Embora Papas Yasmin já demonstre bons resultados — famílias relatam melhora na nutrição das crianças, crescimento mais adequado, maior energia, melhor rendimento escolar — o desafio agora é escalar o projeto. Para isso são necessários:
Investimentos em infraestrutura de produção e distribuição em áreas remotas.
Apoio institucional para que o método possa ser incluído em políticas públicas de nutrição.
Capacitação técnica para manter a qualidade nutricional das fórmulas.
Parcerias com organizações não-governamentais, setor privado e organismos internacionais.
Conclusão
Diante de dados tão contundentes — 40% de desnutrição crónica, milhões de pessoas em insegurança alimentar, dezenas de milhares de casos graves em crianças —, iniciativas como as de Azenalda Miguel deixam de ser apenas inspiradoras para se tornarem essenciais. Papas Yasmin representa uma luz de esperança em meio a um dos momentos mais críticos do país, mostrando que soluções endógenas, baseadas na cultura, nos recursos naturais e no espírito comunitário, podem tornar o combate à fome não apenas possível, mas sustentável.